quarta-feira, 26 de março de 2008

A Alma e a Cidade


Recebemos um contributo por parte do Hélder Morais sobre o campo das festas. O tema em si é extremamente pertinente. É sabido que o Campo das Festas na situação actual representa uma ocupação "estática" de um espaço público, mas daí até se propôr a vinda de outra catedral do consumo julgo que ainda vai uma grande distância. Não podemos enveredar pelo mesmo erro de outros, cuja consequência tem levado a que se construam centros comerciais com lojas que pouco tempo depois se encontram a trespasse, condenando simultaneamente o comércio tradicional.

Aqui vai o artigo do Hélder Morais:


A ALMA DA CIDADE

Uma cidade não é apenas os edifícios, as estradas e as estruturas físicas, existe na cidade uma ideia de sentimento de pertença, uma afectividade que só a vivência civilizacional pode aculturar nos seus habitantes. O conceito de cidade contém em si, um conjunto de factores sociais, psicológicos, memória e identidade. Uma cidade é portanto, o produto da sua evolução histórica, e das vivências dos cidadãos que ao longo do tempo a moldaram e a transformaram.
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A cidade será sempre uma forma de identidade e proximidade entre o espaço e o homem, entre a realidade física e a cultura que nele opera. Cada cidade tem símbolos próprios e significantes sem os quais a ideia de cidade como vivência cultural deixa de ser uma realidade. Transformamos a cidade num mero espaço geográfico de passagem ou de localização mas que não leva a um sentimento de propriedade. Um sentimento de pertença só se obtêm pela ideia de identificação com esses símbolos, que marcam a consciência do cidadão que os construiu e viveu. A identidade da cidade, está na diversidade, dos seus espaços que a individualizam face a outras cidades. Por isso os espaços históricos da urbe são irrepetíveis e únicos. A alteração do espaço físico deve sempre preservar esses locais símbolos de pertença e identidade, pois são eles a alma da cidade, a marca distintiva da sua unicidade.

A notícia da transformação do Campo das Festas em Centro Comercial, não pode de modo algum deixar de ser contrariado por todos aqueles que querem preservar a Covilhã como local de pertença e identidade. Para a Câmara Municipal da Covilhã a ideia de cidade é apenas a de espaço físico e geográfico que pode moldar sem perspectivar a função original de cada local. A decisão de uma administração autárquica circunstancial, não pode modificar e destruir a imagem colectiva dos espaços, em função de interesses eleitorais. Não pode sem critério e respeito pelos valores comuns destruir um símbolo intemporal da nossa terra. O Campo da Festas faz parte do imaginário colectivo da cidade da Covilhã, a sua destruição representa um acto atentatório para a nossa história. O Campo das Festas como lugar que faz parte da alma da cidade deveria ser dignificado, mantendo a sua natureza de espaço público de lazer colectivo. Não é aceitável a sua destruição criando mais um centro comercial descaracterizado e massificado.
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O centro histórico da Covilhã deve ser poupado à especulação e aos investimentos que o aniquilam e lhe retiram a alma, ou seja a memória colectiva da nossa terra. A defesa do centro histórico da Covilhã e dos seus espaços míticos é um serviço público que os agentes políticos, sociais e culturais devem promover. Não deve em troca de qualquer outro benefício ilusório promover-se a descaracterização da cidade. Não existe maior vantagem do que a preservação da memória e identidade da nossa terra …

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